A matéria que estou abordando não é inédita. Já foi suscitada por alguns operadores do direito, sem dúvida com muita competência. Trata-se da conduta flagrantemente inconstitucional e ilegal do Advogado Geral da União, José Eduardo Cardoso”, advogando” os interesses da Chefe do Poder Executivo Federal, Presidente Dilma Rousseff, no processo por crime de responsabilidade/impeachment que responde perante a Câmara Federal, tanto na esfera parlamentar, quanto na judicial.
Porém Cardozo está contrariando a Constituição (art.131) e também a Lei Complementar 73/1993, que regulamenta o citado dispositivo constitucional. Segundo o artigo 131 da CF”, A Advocacia Geral da União é uma instituição que, diretamente, ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre a sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento do Poder Executivo”.
A Lei Complementar Nº 73/1993, que disciplina a matéria, nos termos do mandamento constitucional previsto no seu artigo 131, dispõe no artigo 1º, que “ A Advocacia-Geral da União é a instituição que representa a União judicial e extrajudicialmente. Pelo seu parágrafo único”, À AGU cabem as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos desta Lei Complementar”.
Trocando tais disposições, constitucional e legal, em miúdos, a função da AGU é representar a União, integrada pelos seus Três Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, em todas as demandas judiciais ou extrajudiciais em que for parte, competindo –lhe, também, a função de “assessoria” e “consultoria” ao Poder Executivo.
Porém o envolvimento do Advogado-Geral da União no episódio da apuração de crime de crime de responsabilidade/impeachment da Presidente Dilma, não só vai muito além do que lhe é permitido pelas leis (assessoramento e consultoria), como ao mesmo tempo entra em flagrante conflito com o “cliente” do qual estaria servindo como advogado, advogando os interesses de uma parte desse “cliente”, contra a outra parte desse mesmo “cliente”. Um mesmo cérebro não pode comandar uma luta de um braço contra o outro.
Na verdade nunca poderia o Advogado-Geral da União tomar partido, como advogado, seja judicial ou extrajudicialmente, do Poder Executivo(Dilma Rousseff), contra o Poder Legislativo, porque ambos compõem a mesma pessoa jurídica, a União, no processo de impeachment da Presidente, ou em qualquer outro, que ao lado do Poder Judiciário, todos são integrantes, em igualdade de condições, dentro das suas respectivas competência constitucionais, da pessoa jurídica de direito público interno denominada UNIÃO.
Cardozo também está abusando do poder. Quem estudar a estrutura que foi dada à Advocacia-Geral da União ficará impressionado com o seu gigantismo, e compreenderá perfeitamente a dificuldade que teria qualquer pessoa ou entidade que fosse alvo dos seus “ataques”. Esse eventual “confronto” estaria à beira da covardia, tamanha a desigualdade de forças. Seria como um homem só enfrentar um exército.
No caso do impeachment em curso, o Advogado-Geral da União declarou guerra ao Poder Legislativo, que é uma parte do seu “cliente”, e colocou toda a estrutura do “gigante” que comanda a bombardear o Supremo Tribunal Federal, com toda a espécie de procedimento, como num tiroteio cerrado, onde lá pelas tantas um dos tiros poderá acertar, num total desrespeito ao STF, que talvez até fique “constrangido”, ou mesmo “acovardado”, em aplicar a punição por pedido temerário ou litigância de má, como frequentemente acontece na verdadeira Justiça, a “lá de baixo”.
Então peço até perdão pelo que vou escrever: estão fazendo a Justiça de “palhaça”. Justifico: o Supremo não tem a estrutura “gigantesca” (que tem a AGU) que seria necessária para dar conta da sua missão de “Corte Constitucional”, a serviço da sociedade “comum”, e ao mesmo tempo dar conta da avalanche de ações que recebe diariamente, como instância originária, sobre o impeachment, e também dos batalhões de advogados contratados pelos réus da “Lava Jato”, pagos a peso de ouro pelos “novos ricos”, que se serviram à vontade, e ilicitamente, dos cofres públicos. Por sua falta de estrutura, o Supremo mais parece hoje um “Tribunal de Governo”, o que se agrava sobremaneira devido ao baixo nível moral desse Governo, que infelizmente é quem escolhe os membros dos tribunais superiores no Brasil, inclusive do Supremo, pelos evidentes riscos que isso pode representar à sociedade.
Mas o que faz a gente quase perder toda a esperança de reverter esse quadro caótico em que meteram o Brasil, com ou sem impeachment de Dilma, é que todas essas irregularidades acontecem na “cara” de todo o mundo, e também das mais respeitadas instituições jurídicas, inclusive da Corte Máxima da Justiça brasileira. E todas elas “engolem”, sem qualquer reação, essas barbaridades jurídicas, onde os seus membros nunca honram os compromissos e juramentos feitos após deixarem a Faculdade de Direito e ingressarem na vida ativa profissional, em qualquer das áreas privativas dos operadores do direito.
Mas uma coisa é certa. Não é por falta de conhecimentos jurídicos que os Ministros do Supremo geralmente favorecem o Governo, deixando Cardozo livre na tribuna para advogar os interesses de Dilma contra a Câmara, que qualquer estudante de Direito sabe que não poderia. Então a omissão desse Tribunal em apontar as irregularidades aqui tratadas só poderiam ser atribuídas à conivência ou mesmo “parceria” com o Governo, não havendo maneira de precisar se dolosa ou culposa.
Resumidamente, pode-se afirmar sem medo de erro que essa caótica situação vivida no mundo jurídico brasileiro sem dúvida é reflexo da podridão generalizada que foi instalada no país, que protagonizou a passagem do Brasil do Estado de Direito para o seu contrário, para o Estado de (anti)Direito. Enquanto essa situação não for corrigida, o Brasil continuará sendo o fracasso que é hoje, em todos os sentidos. Nenhuma sociedade conseguirá ser justa e prosperar pelos caminhos do Estado de (anti) Direito, que sempre abre as suas portas para ser comandada pela sua pior escória.
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