quarta-feira, 22 de julho de 2015

Cingapura: por trás das grandes corporações.

INSTITUTO LIBERAL
Por João Cesar de Melo, publicado no Instituto Liberal
As primeiras luzes que se acendem na silhueta de Cingapura são as dos letreiros localizados no alto dos arranha-céus. Bancos. Muitos bancos. O que a paisagem não mostra é que para cada uma dessas grandes corporações existem centenas de hotéis, restaurantes e lojas de luxo; e para cada uma dessas existem milhares de pequenos negócios mantidos por pessoas comuns para atender pessoas comuns; e tudo isso emprega milhões de pessoas numa cidade desenvolvida social, econômica e urbanisticamente a um nível invejado até pelos países mais ricos do ocidente.
O que o governo de Cingapura fez para transformar uma gigantesca favela num dos países mais ricos e desenvolvidos do mundo? Na verdade, a pergunta está errada. A pergunta correta é: O que o governo de Cingapura NÃO fez pelo desenvolvimento do país?
1° – Não tentou implantar uma política monetária, preferiu deixar sua moeda atrelada a outras − currency board −, não se atrevendo a manipulá-la para criar panoramas econômicos artificiais, o que atraiu investimentos estrangeiros de longo prazo e em grande escala.
2° – Não recorreu a empréstimos internacionais, obrigando o Estado e a economia local a buscar em si mesmos as soluções para seus problemas e os investimentos para seus projetos.
3° – Não impediu a entrada de grandes corporações capitalistas sob o argumento, tão comum na América Latina, de que isso feriria a soberania e roubaria o capital nacional.
4° – Não ousou controlar o mercado. Desde sua independência da Malásia, em 1965, o país segue a política (ou melhor, a não-política) de facilitar a vida da iniciativa privada, seja ela individual ou empresarial, nacional ou estrangeira. Baixa tributação e quase nada de regulação e de burocracia (o que, por si só, já minimiza o ambiente para a corrupção) possibilitaram que pessoas e empresas se dedicassem apenas a superar suas próprias limitações e os desafios do mercado para prosperarem.
5° – Não avançou sobre a propriedade privada sob o argumento de atender “interesses coletivos”.
6° – Não fez do governo um gigantesco cabide de empregos, mantendo o princípio de eficiência administrativa, consumindo menos de 20% do PIB nacional.
7° – Não implantou programas sociais em descompasso com o desenvolvimento econômico.
O resultado é visto nas ruas, na “cota do pedestre”, como dizem os arquitetos e urbanistas. Calçadas amplas e limpas, praças e parques maravilhosamente arborizados, lojas e restaurantes cheios todos os dias, moradores e imigrantes de todas as partes do mundo interagindo entre si econômica, social e culturalmente. Quase não se vê policiais. Não há mendigos. Não há favelas. Não há violência urbana. As escolas estimulam as crianças a ler, escrever e fazer contas, não a “brincar de médico” com o coleguinha. A Universidade é um lugar voltado para a pesquisa, não para a militância socialista.
Mesmo longe do centro empresarial e turístico da cidade, vemos e sentimos o que a liberdade econômica produz. Tomando como exemplo os bairros onde moram os imigrantes (chineses, indianos, paquistaneses etc), são áreas totalmente urbanizadas e arborizadas que contam com praças, parques, escolas, centros comerciais e um excelente sistema de transporte coletivo. A cidade, em toda sua modernidade, passa-nos a impressão de ter sido plantada dentro de uma floresta, dado o nível de arborização em todas as ruas, em todos os bairros.
Lee Kuan Yew, o homem que liderou tanto o processo de independência do país quanto seu desenvolvimento social e econômico é acusado de ter sido um déspota e também de ter limitado muitas liberdades civis e culturais. Diante disso, creio ser pertinente compararmos seu governo ao de outro líder, Fidel Castro, já que ambos assumiram o papel de “salvadores da pátria” na mesma época e permaneceram no poder por muitas décadas.
Cingapura não conta com nenhum recurso natural e à véspera de sua independência era um canto esquecido e miserável do mundo; Cuba é rica em recursos naturais e à véspera da revolução socialista era um dos países mais desenvolvidos do continente americano.
Lee Kuan Yew levou a pequena ilha de Cingapura à independência por vias legais, sem perseguições, sem expropriações, sem fuzilamentos; Fidel e seus anjinhos socialistas, a partir da revolução que promoveram, perseguiram, expropriaram e fuzilaram milhares de pessoas.
Lee Kuan Yew moldou seu projeto de desenvolvimento sobre os pilares da liberdade econômica; Fidel moldou seu projeto progressista proibindo a iniciativa privada.
Lee Kuan Yew incentivou a integração de Cingapura com o resto do mundo, principalmente com os países mais desenvolvidos, instaurando o inglês como língua oficial e convidando as multinacionais a ganharem dinheiro em seu país; Fidel impôs o nacionalismo em mais alto grau, proibindo a instalação de empresas estrangeiras e coibindo qualquer manifestação cultural que não fosse por meio da língua local e alinhada aos interesses da “revolução”.
Lee Kuan Yew proibiu as pessoas de mascarem chicletes na rua; Fidel proibiu os cubanos de saírem de Cuba.
Lee Kuan Yew tomou distância de todas as ditaduras socialistas e coibiu qualquer movimento de esquerda; Fidel se aliou a todas as outras ditaduras socialistas e tornou-se o principal mentor e patrocinador de todos os movimentos de esquerda da América Latina e África.
Lee Kuan Yew manteve o Estado enxuto e funcional; Fidel fez do Estado a casa de seu partido e vetor de doutrinação ideológica.
O resultado: Cuba foi transformada no que Cingapura era antes de sua independência; Cingapura foi transformada na cidade onde qualquer pessoa do mundo gostaria de viver. A segunda conclusão é que, sejam quais forem os programas sociais e os projetos de infraestrutura almejados por um governo, eles devem se sustentar sobre uma economia sólida e dinâmica, o que só é atingido por meio da liberdade econômica − dinheiro não brota do chão logo após conversas filosóficas, como creem os socialistas.
Cingapura sempre teve e ainda tem seus programas sociais, mas cada um deles foi implantado na medida do enriquecimento do país, o contrário do que foi feito em Cuba e em todas as ditaduras e governos socialistas, onde tentaram oferecer tudo a todos sem permitir que as pessoas pudessem pensar e trabalhar em função de si mesmas.
Cingapura ocupa a 2° posição no ranking de liberdade econômica (entre Hong Kong e Nova Zelândia) e a 9° posição no índice de desenvolvimento humano (entre Dinamarca e Canadá). Até quando governos, sociedades e indivíduos irão ignorar a correlação entre liberdade econômica e desenvolvimento social?

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