Se alguém tivesse de cumprir a desagradável missão de escolher o discurso mais infeliz de Dilma Rousseff, estaria certamente diante de uma difícil tarefa. A competição da presidente consigo mesma, nesse quesito, é feroz. A fala desta sexta-feira, ao receber presidentes do Mercosul, no Palácio do Itamaraty, chega a ser nauseante. E por vários fatores que se combinam.
Para uma audiência que reunia truculentos notáveis como Nicolás Maduro (Venezuela), Cristina Kirchner (Argentina) e Evo Morales (Bolívia), a presidente brasileira teve a coragem de afirmar:
“Somos uma região que sofreu muito com as ditaduras. Somos uma região onde a democracia floresce e amadurece. No ano passado, houve eleições gerais no Uruguai e no Brasil. Este ano, é a vez da Argentina e da Venezuela. A realização periódica e regular desses pleitos dá capacidade de lidar com as diferenças políticas. Temos de persistir nesse caminho, evitando que as disputas incitem a violência. Não há espaço para aventuras antidemocráticas na América do Sul.”
“Somos uma região que sofreu muito com as ditaduras. Somos uma região onde a democracia floresce e amadurece. No ano passado, houve eleições gerais no Uruguai e no Brasil. Este ano, é a vez da Argentina e da Venezuela. A realização periódica e regular desses pleitos dá capacidade de lidar com as diferenças políticas. Temos de persistir nesse caminho, evitando que as disputas incitem a violência. Não há espaço para aventuras antidemocráticas na América do Sul.”
É bem provável que Dilma estivesse querendo dizer que uma eventual ação em favor do seu impeachment ou que a cassação do seu mandato pelo TSE se encaixariam na classificação de “aventuras antidemocráticas”. É claro que ela sabe ser uma mentira escandalosa.
Dilma pode não ser o melhor exemplo a que pode chegar a inteligência política brasileira, mas ela sabe que a simples realização de eleições não garante um regime democrático. Fazer tal afirmação diante de um ditador asqueroso como Nicolás Maduro e de um protoditador como Evo Morales chega a ser uma provocação grotesca ao bom senso. No ano passado, 40 pessoas foram assassinadas nas ruas da Venezuela por milícias a serviço do regime. Há presos políticos no país, e a imprensa está sob severa censura.
E coube justamente a Maduro descer ao esgoto moral. Afirmou:
“Temos um presidente indígena (Morales), há um movimento bolivariano, que somos nós, de pé. E ninguém vai nos apagar do mapa. Nenhuma pressão política vai nos apagar. Há 40 anos, houve o Plano Condor, e não desaparecemos. Somos um projeto democrático, inclusivo”.
“Temos um presidente indígena (Morales), há um movimento bolivariano, que somos nós, de pé. E ninguém vai nos apagar do mapa. Nenhuma pressão política vai nos apagar. Há 40 anos, houve o Plano Condor, e não desaparecemos. Somos um projeto democrático, inclusivo”.
O “Plano Condor” é o nome pelo qual é conhecida a colaboração entre as várias ditaduras militares havidas na América do Sul nas décadas de 60 e 70. Hoje, regimes violentos e populistas também se amparam mutuamente, todos eles endossados pelos governos do PT, partido que sonhou emplacar por aqui algo semelhante. Trata-se de um “Plano Condor de esquerda”. Aliás, quando Dilma insiste em associar o cumprimento da lei à quebra da ordem democrática, ela o faz sob a inspiração desse pensamento delinquente.
E, claro, a pantomima não estaria completa sem a homenagem de Dilma a Cristina Kirchner, que voltou a levar a Argentina à beira do abismo:
“Nesses oito anos em que lhe coube presidir a nação Argentina, você imprimiu posição firme e democrática a seu país. Do ponto de vista pessoal e político, quero dizer que você terá no Brasil uma amiga sempre pronta para compartilhar sistematicamente sonhos e esperanças”.
“Nesses oito anos em que lhe coube presidir a nação Argentina, você imprimiu posição firme e democrática a seu país. Do ponto de vista pessoal e político, quero dizer que você terá no Brasil uma amiga sempre pronta para compartilhar sistematicamente sonhos e esperanças”.
A brasileira, acreditem, tinha lágrimas nos olhos. No poder, Cristina Kirchner estimulou, ela também, a formação de verdadeiras milícias e tentou censurar a imprensa livre. O cadáver do promotor Alberto Nisman se revirou no túmulo. Dilma, no entanto, chorou de emoção. E aí falou a louca de Buenos Aíres:
“Qualquer Estado integrante do Mercosul, ou da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), em que o governo seja removido por outro que não seja produto de eleições livres, populares e democraticamente eleito perde o caráter de Estado membro.”
“Qualquer Estado integrante do Mercosul, ou da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), em que o governo seja removido por outro que não seja produto de eleições livres, populares e democraticamente eleito perde o caráter de Estado membro.”
Também é de revirar o estômago. Cristina e Dilma, juntas, suspenderam o democrático Paraguai do Mercosul — por ter deposto legal e legitimamente um presidente — e aproveitaram o momento para abrigar a Venezuela do ainda vivo Hugo Chávez. Até então, o Senado paraguaio se negava a aprovar o ingresso do novo membro justamente porque reconhecia o país por aquilo que é: uma ditadura.
Ah, sim: a cerimônia marcou o ingresso da… Bolívia no Mercosul! O bloco já é hoje um atraso de vida para o Brasil. Entre outras razões, porque as decisões têm de ser tomadas por consenso. O bloco impede o Brasil de celebrar acordos bilaterais substantivos porque tem de se vergar às restrições de seus parceiros. Agora, teremos de nos submeter também às exigências bolivianas.
Enquanto isso, livres para voar, Chile, Peru, Colômbia e México celebram a Aliança do Pacífico, de costas, literalmente, para os bocós do Mercosul. O mal que o PT faz ao Brasil vai deixar mascar por muitas décadas. Já estamos começando a viver a herança maldita. E ela está apenas no começo.
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