Ao receber o controle de duas diretorias da BR
Distribuidora, uma subsidiária da Petrobras, o ex-presidente estabeleceu seu
próprio balcão de negócios no “petrolão”. A Lava Jato foi bater à sua
porta.
Nas projeções mais
otimistas, calcula-se que corruptos e corruptores envolvidos no escândalo da
Petrobras tenham desviado algo perto de 19 bilhões de reais dos cofres da
empresa. A estatal era o paraíso, o nirvana para gente desonesta, incluindo os
empreiteiros, os servidores públicos e os políticos já identificados como
parceiros da partilha do dinheiro roubado. Na semana passada, o lobista Julio
Camargo, um dos delatores do caso, tentou explicar ao juiz Sergio Moro a essência
do petrolão. Na visão dele, a corrupção na Petrobras poderia ser ilustrada pela
figura do fruto proibido. Os contratos eram como maçãs que os empreiteiros
ansiavam saborear em sua plenitude. O que os impedia eram os partidos e os
políticos da base do governo. "É aquela história, olhar a maçã e dizer:
'Como vou pegar essa maçã? Tem uma regra do jogo que eu preciso atender. Do
contrário, não vou comer a maçã' ", disse Camargo. A "regra do
jogo", o caminho mais curto para alcançar a árvore e apoderar-se dos frutos,
como as investigações da Operação Lava-Jato já revelaram, era pagar propina.
Durante os dois primeiros mandatos de Lula e ao longo de todo o primeiro
mandato de Dilma Rousseff, o PT usou o pomar para governar. Distribuir as maçãs
virou um método, um atalho que o partido encontrou para garantir a fidelidade
dos amigos e seduzir eventuais adversários, transformando-os em cúmplices de um
crime contra toda a sociedade. Na semana passada, a polícia bateu na porta de
alguns convivas do banquete.
Os investigadores cumpriram 53 mandados de busca e
apreensão nas residências e nos escritórios de políticos suspeitos de corrupção
no escândalo da Petrobras. Entre os alvos estavam parlamentares e
ex-parlamentares, incluindo dois ex-ministros do governo da presidente Dilma.
No episódio mais emblemático da ação, os agentes devolveram ao noticiário
político-policial a antológica Casa da Dinda, a residência do ex-presidente
Fernando Collor, cenário do escândalo que, nos anos 90, levou ao primeiro
impeachment de um presidente da República. Os policiais apreenderam documentos,
computadores e três carros de luxo da frota particular do atual senador: um
Lamborghini Aventador top de linha (3,5 milhões de reais), uma Ferrari vermelha
(1,5 milhão de reais) e um Porsche (700 000 reais). Nem o bilionário empresário
Eike Batista em seus tempos de bonança exibia modelos tão exclusivos - e caros.
Collor, até onde se sabe, é um empresário de sucesso. Sua
família é proprietária de emissoras de televisão e rádio em Alagoas, terrenos, apartamentos,
títulos, ações, carros... A relação de bens declarados pelo senador soma 20
milhões de reais, o suficiente para garantir vida confortável a qualquer um.
Collor, apesar disso, não resistiu à tentação e adentrou
o pomar petista. Em 2009, ele assumiu a presidência da Comissão de
Infraestrutura do Senado. Com significativo poder para fiscalizar os destinos
das obras do PAC, a vitrine de campanha da então candidata Dilma Rousseff, o
senador se apresentava como um obstáculo para o governo. A maçã lhe foi
oferecida. O ex-presidente Lula entregou ao senador duas diretorias da BR
Distribuidora, uma subsidiária da Petrobras - a diretoria da Rede de Postos de
Serviço e a de Operações e Logística. No comando desse feudo, segundo os
investigadores, Fernando Collor criou o seu balcão particular de negócios
dentro da maior estatal brasileira, o que lhe renderia milhões em dividendos.
Segundo depoimentos colhidos na Lava-Jato, o esquema
obedecia a uma lógica simples. As empresas que tinham interesse em assinar contratos
com a BR acertavam antes "a parte do senador". Foram dezenas de
contratos. A polícia já identificou dois que passaram por esse crivo. Num
deles, de 300 milhões, um empresário do ramo de combustíveis pagou a Collor 3
milhões de reais em propinas para viabilizar a compra de uma rede de postos em
São Paulo. A operação foi revelada pelo doleiro Alberto Youssef em acordo de
delação premiada. Encarregado de providenciar o suborno ao senador, Youssef fez
a entrega de "comissões" em dinheiro, depósitos diretos na conta do
parlamentar e transferências para uma empresa de fachada que pertence a Collor.
O Lamborghini, até recentemente o único do modelo no Brasil, está em nome da
tal empresa, o que fez os investigadores suspeitar que o carro foi bancado com dinheiro
desviado da Petrobras. Desde o ano passado, quando explodiu a Operação
Lava-Jato e as torneiras da corrupção se fecharam, o IPVA do carro não é pago
pelo ex-presidente. A dívida acumulada é de 250 000 reais. Mas não é desapego
do senador. Zeloso, ele só usava o carro para passeios esporádicos a um
shopping de Brasília. Quando isso acontecia, o Lamborghini permanecia sob a
vigilância de dois seguranças do senador, que fixavam um perímetro de
isolamento em torno do veículo para evitar a aproximação dos curiosos. A frota
de luxo de Collor - revela Lauro Jardim, na seção Radar - conta com um
Rolls-Royce Phantom 2006, mais exclusivo ainda do que o Lamborghini.
*Por Rodrigo Rangel e Robson Bonin
http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/como-collor-foi-aceito-no-pomar-magico-dos-petistas/
Nenhum comentário:
Postar um comentário