sábado, 7 de setembro de 2013

Como o Irã pretende tirar vantagem de uma ação militar ocidental na Síria.



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O Presidente iraniano Hassan Rouhani em Teerã,ontem (BEHROUZ MEHRI/AFP/Getty Images).
Costuma-se dizer nos meios diplomáticos e de inteligência, que uma Síria enfraquecida significa uma diminuição da influência regional do Irã, mas, que uma intervenção militar dos EUA no país poderia realmente beneficiar a nação persa. Nem o governo de Damasco nem o de Teerã estabeleceram qualquer estratégia sofisticada para responder a um ataque americano à Síria, mas é claro que Teerã vai ativar seus próceres militantes na região, incluindo o Hezbollah do Líbano, caso isso aconteça. Se atacarem, os EUA também devem esperar a oposição ferrenha a Washington por parte dos jihadistas sunitas e grupos islâmicos radicais, visando obterem concessões em outros lugares.
O Irã, de fato, já se envolveu diplomaticamente com muitos dos envolvidos na guerra civil da Síria. O Ministro dos Negócios Exteriores e chefe da segurança nacional do Irã, Alaeddin Boroujerdi, liderou, na semana passada, uma delegação que foi a Damasco, presumivelmente para discutir um possível e iminente ataque dos EUA. Vladimir Putin, que preside atualmente a Rússia conversou com o novo presidente do Irã, Hassan Rouhani, por telefone, e a gravação da conversa foi passada para o subsecretário geral da ONU, para Assuntos Políticos, Jeffrey Feltman em sua visita a Teerã, onde ele e o ministro do Exterior iraniano Mohammad Javad Zarif também discutiram sobre a Síria. Até mesmo o sultão de Omã fez uma rara visita ao Irã, supostamente levando com ele as mensagens positivas da administração Obama para o novo governo iraniano.
A retórica de Teerã – em particular a de sua liderança militar – tem sido surpreendentemente pacífica, principalmente tendo em vista que o governo islamofascista persa é costumeiro em se antagonizar com Washington quando as tensões entre os dois países esquentam, o que de fato ocorreu pela situação da Síria. A Síria é uma aliada iraniana chave, e o mesmo para a sobrevivência do regime de al Assad, havendo interesses mútuos de segurança nacional. O Irã, por sua vez, não pode se dar ao luxo de retaliar diretamente os Estados Unidos, mas é amplamente esperado que retalie indiretamente através de seus próceres militantes na região.
Os iranianos, extremamente hábeis em explorar as profundas divergências religiosas que separam as diversas seitas islâmicas, devem fazer mais do que ativar os grupos jihadistas e, em caso de ataque americano, mesmo que apenas aéreo e cirúrgico, os iranianos devem manobrar como fizeram no Afeganistão e no Iraque. Se os EUA, com uma possível zona de exclusão aérea sobre a Síria, e ataques cirúrgicos que minem a capacidade militar do regime alauíta de Damasco, em última análise, causarem a derrubada de Bashar al Assad, sem haver ações terrestres de invasão e conquista, os estrategistas iranianos que ajudaram a elaborar a abordagem da Irmandade Muçulmana, amplamente dominada pelos sunitas, estarão novamente no poder. E então persas e jihadistas antiamericanos terão apenas que agradecer sarcasticamente a Washington pela ajuda americana.  
No entanto, a situação na Síria é diferente da que havia no Afeganistão e no Iraque. Desta vez o que Teerã quer tirar partido é da aversão de Washington à mudança de regime na Síria. Na verdade, a única e falsa razão de os Estados Unidos quererem substituir al Assad é para conter a influência regional do Irã – um contracenso geopolítico –, uma vez que a importância do regime alawita cresceu consideravelmente para os EUA após a queda de Saddam.
Mas Washington não quer derrubar al Assad só para ver Damasco sob controle da Al Qaeda e dos jihadistas da Irmandade Muçulmana. Isto explica em parte por que Hossein Mousavian, um colaborador próximo a Rouhani, escreveu um editorial em 29 de agosto, dizendo que “a mudança de regime em Cabul é um modelo para uma nova colaboração" entre Washington e Teerã. Mousavian chamado para integrar a cooperação EUA-Irã e fazê-la se estender à Síria e, assim, gerenciar melhor a crise na região.
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Apesar de existir uma possibilidade potencial de EUA e Irã passarem a colaborar na Síria, a ação dos militares americanos sem dúvida enfraqueceriam esse país. Isto acarreta sérios riscos para os interesses iranianos na área. Uma Síria inamistosa poderia isolar o Irã do Hezbollah, seu proeminente aliado árabe não estatal, e prejudicar as relações com seus aliados iraquianos.
No entanto, ataques aéreos limitados sobre a Síria que não prejudiquem o regime de al Assad poderiam, afinal, trabalhar em favor do Irã. Tais ataques poderiam dividir a rebelião entre facções que se opõem à intervenção militar e aquelas que são a favor disso. Através de seus aliados sírios, libaneses e iraquianos, os iranianos, então, seriam capazes de gerir melhor a guerra civil síria, que inclui elementos radicais islâmicos.
Como esses elementos vêm ganhando mais território, os Estados Unidos podem precisar de cooperação iraniana na forja de um novo governo sírio. Washington está atualmente se preparando para falar diretamente com Teerã sobre o seu polêmico programa nuclear. O governo iraniano já ligou estas duas questões e acredita que a Síria poderia usar a intervenção ocidental a seu favor, uma vez que negocia o problema nuclear.
O Irã não pode descartar a possibilidade de que, mesmo sendo ação militar americana limitada, ela vai enfraquecer o regime. Também não se pode concluir que Washington não pretenda realizar uma ampla campanha mais real e menos simbólica contra al Assad. Mas pode, no entanto, preparar-se para um ou outro resultado. Estrategistas em Teerã sabem que os americanos têm superioridade aérea, mas eles sabem que o Irã tem a vantagem no chão, na Síria, no Líbano e no Iraque.
Assim, o Irã está posicionado para fomentar a insurreição. (E a invasão, pela experiência com do Iraque, mostra que o Irã é bom em fomentar revoltas antiamericanas). Qualquer insurgência agravaria as tensões sectárias na Síria e em toda a região e, por sua vez, radicalizaria ainda mais as milícias sunitas. Se os jihadistas ganharem terreno forçarão os Estados Unidos a trabalhar com Teerã para conter o radicalismo sunita.
No cenário improvável em que os Estados Unidos tornam-se envolvidos numa outra grande guerra, desembaraçarem-se dessa guerra seria necessariamente pela cooperação com o Irã. Mas o que realmente dá o Irã alavancagem é o fato de que, desde 9/11, os jihadistas e os grupos islâmicos tiveram a oportunidade de conquistar o poder quando os regimes árabes colapsaram.
Ao contrário dos vizinhos árabes da Síria, que querem a estabilidade na região, o Irã saúda a crise e a instabilidade. O Irã é razoavelmente seguro internamente e sabe que sua esfera de influência pode enfraquecer, mas que, ultimamente, não se dissolverá. Os estrategistas acreditam também que, tendo vivido sob sanções há décadas, o Irã se acostumou ao sofrimento. Assim, enquanto o caos na Síria possa ameaçar Estados árabes, inerentemente fracos, não afetaria tanto o Irã. Teerã poderia, então, explorar o caos árabe para a sua vantagem.
Em vista dos riscos, é improvável que os Estados Unidos se envolvam deliberadamente numa intervenção militar em grande escala na Síria. Mas o Irã não pode ter tanta certeza sobre as intenções norteamericanas, e terá que explicar as consequências não intencionais da ação militar, mesmo mínima. É por esta razão que Teerã tem planejado para contingências múltiplas.

Muita coisa pode dar errado, ao longo da execução dos planos, especialmente quando a situação é tão fluida como a da Síria. Para o Irã, essa fluidez oferece alguns riscos, mas também oferece algumas oportunidades. A crença comum de que o pós-al Assad na Síria, invariavelmente, seria ruim para o Irã não é uma garantia.
*Francisco Vianna, com mídia internacional.

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