Partido pediu socorro a Garotinho para conter a briga política em Itaocara e evitar que a vitrine socialista se transforme em vexame nacional.
Alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, o prefeito de uma pequena cidade pega o próprio carro, um Fusca montado com caixas de som, e passa a convocar a população aos brados para protestar na Câmara Municipal, controlada pela oposição. Poderia ser Sucupira, a cidade fictícia de Odorico Paraguaçu em O Bem Amado, mas a cena ocorreu em meados de dezembro em Itaocara, no Noroeste Fluminense. “Se quiser me matar pode matar. Nós acabamos com a corrupção, por isso estão com raiva”, diz, em um trecho de sua pregação, registrada em vídeo e publicada no Youtube, o prefeito Gelsimar Gonzaga, primeiro governante eleito pelo PSOL no país. O município de 23.000 habitantes imediatamente tornou-se vitrine para o partido. Ex-sindicalista, Gelsimar assumiu com medidas populistas de alto poder de repercussão, como a redução do próprio salário e a escolha de secretários em “assembleias populares”, por aclamação. O resultado destas e outras experiências de teorias do PSOL, em confronto com as necessidades da população e a realidade das pequenas cidades, é um caos administrativo e político que paralisa o poder público e penaliza a população.
Os 44% de preferência (6.796 voto) do PSOL na cidade puseram Itaocara no mapa do partido no primeiro turno de 2012. A cidade logo virou vitrine e tornou-se ponto de peregrinação dos cabeças da sigla, como Ivan Valente, deputado federal por São Paulo, Luciana Genro, ex-deputada pelo Rio Grande do Sul, e Marcelo Freixo, deputado estadual fluminense. Itaocara, desejava o partido, deveria ser um modelo de gestão inovador, diferente de “tudo isso que está aí”, como fisiologismo e concessões a aliados políticos. O primeiro ano da gestão de Gelsimar, no entanto, não saiu como imaginavam ele e o partido. Em guerra com o Legislativo, que transformou a CPI em uma “comissão processante”, com poderes para aprovar inclusive o impeachment do mandatário, Itaocara terminou 2013 com salários atrasados para servidores, médicos em greve e nenhuma perspectiva de resolução do impasse com os vereadores.
O caos em Itaocara mobilizou a cúpula do PSOL no Rio de Janeiro. No fim do ano passado, o partido pôs na rua uma operação que se assemelha às velhas práticas da política. Com Gelsimar encurralado na Câmara Municipal – dos onze vereadores, dez são de oposição – foi necessário recorrer a um aliado para tentar evitar que a vitrine socialista se transforme em vexame nacional. O processo foi liderado pelo deputado estadual Marcelo Freixo, alçado ao status de maior liderança do PSOL no Estado desde a conquista do segundo lugar na eleição contra Eduardo Paes. Ao perceber que uma Câmara dominada pelo PR estava articulando o impeachment do aliado, Freixo buscou ninguém menos que Anthony Garotinho para tentar uma composição. O ex-governador é abertamente criticado por Freixo e pelo PSOL.
A negociação mostra como a população de Itaocara está, atualmente, espremida na condição de moeda de troca da política. De início, não foi simples construir um acordo pela governabilidade em Itaocara. O PSOL faz oposição ferrenha ao governo de Rosinha Garotinho em Campos dos Goytacazes (RJ), influenciando sindicatos e dificultando a adoção de medidas na área da educação. Mas Garotinho cedeu – não por solidariedade, ressalte-se. Simplesmente por ter outros adversários mais importantes para se preocupar em 2014, como Sérgio Cabral e Lindbergh Farias. O pedido de ajuda do PSOL a Garotinho é o prenúncio de outro muito maior que está por vir: Freixo precisará dos votos do PR se não quiser ver cassada Janira Rocha, a deputada estadual que desviou dinheiro de um sindicato para campanhas do PSOL.
Com alguns telefonemas, Garotinho articulou um encontro entre Freixo e o vereador Robertinho, presidente da Câmara de Itaocara. A conversa nas últimas semanas de 2013, também presenciada pelo deputado federal Paulo Feijó (PR), o deputado estadual Paulo Ramos (PSOL) e dois vereadores, traçou um cenário de paz para este ano. Não será tão simples: Robertinho diz que não dará trégua e chama Gelsimar de “louco”. Ele acusa o prefeito de beneficiar apadrinhados com pagamento de horas extras e de ter contratado um ônibus por 7.000 reais para levar estudantes a um congresso do PSOL em Goiânia.
Se preocupar pra quê? Não entendo o garotinho, ele não faz nada pra ninguém mesmo!
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