sábado, 19 de janeiro de 2013

A volta de Renan.

Em outubro de 2007, depois de renunciar à presidência do Senado, Renan Calheiros foi absolvido, em votação secreta, de todos os crimes que recomendavam aos berros a cassação do seu mandato. Comentei o episódio abjeto num artigo publicado simultaneamente no Jornal do Brasil e na Gazeta Mercantil. Neste começo de 2013, o senador alagoano está pronto para ser reconduzido ao cargo que desonrou. “Os ratos seguem no barco”, resumiu o título do artigo escrito há pouco mais de cinco anos. O iminente retorno de Renan à presidência da Casa do Espanto avisa que os roedores insaciáveis continuam por lá ─ e torna lastimavelmente atual o texto de 9 de outubro de 2007. Confira:
A tropa de choque que marcha à frente dos 45 comparsas de Renan Calheiros achou insuficiente revogar a decência e transformar o Senado no primeiro clube de cafajestes da terceira idade. Além do enterro da moral e dos bons costumes, seus componentes também providenciaram a desmoralização de duas crenças promovidas a verdades incontestáveis pelo critério da longevidade. Foram reduzidas a crendices tão verossímeis quanto a mula-sem-cabeça.
A primeira sustentava que, para qualquer político profissional, o instinto de sobrevivência eleitoral sempre prevaleceria sobre tudo o mais ─ amizades de infância, alianças históricas, convicções ideológica; tudo. Engano, informou a absolvição de Renan. Para livrá-lo da guilhotina, os parceiros do pecador escalaram espontaneamente o cadafalso. Uns poucos tentaram camuflar a abjeção com minuetos patéticos. Os outros optaram pelo suicídio com o peito estufado de mussolini-de-hospício.
A segunda teoria desintegrada pelo bando garantia que os ratos são sempre os primeiros a abandonar o barco prestes a naufragar. O comportamento dos roedores a serviço de Renan sugere que alguma mutação genética resultou no surgimento de uma subespécie perturbadoramente audaciosa:. o rato-do-Senado. Essa maravilha da fauna política brasileira não tenta escapar da morte. Prefere esperar a bordo a consumação da tragédia.
Pior: confrontados com a ameaça letal, os ratos-do-Senado fazem qualquer negócio para precipitar o desastre. O pelotão de sabotadores continua nos porões, agindo nas sombras. Os demais sobem dos porões para combater no tombadilho, divididos em dois grupos. O primeiro trata de abortar tentativas de salvamento. O segundo cuida de manter a embarcação na rota que conduz ao afogamento coletivo.
No momento, penduram-se no leme quatro espécimes que atrairiam multidões de visitantes ao mais mambembe dos zoológicos. Almeida Lima só ruge. Leomar Quintanilha só mia. Wellington Salgado só berra. Gilvan Borges se expressa num dialeto ainda indecifrável. Miando, Quintanilha conseguiu fazer de Almeida Lima o relator de outro processo contra Renan. Rugindo, Almeida Lima anunciou que não vai admitir críticas ao seu desempenho: promete revidar com “um sapatão na cara”. Caso se desencadeie a guerra dos calçados, não convém contar com Welllington Salgado: essa versão devassa de Rapunzel estará usando o chinelinho novo que ganhou de Lula. Nem com Gilvan Borges: ele só calça sandálias de couro cru (sem meias). Combinam com os ternos de Gilvan: todos estimulam a suspeita de que o defunto era mais baixo e mais magro. O senador pelo Amapá explica que nunca foi de dar muito valor a regras estéticas. A regras morais nunca deu valor nenhum.
Se Deus poupou JK do sentimento do medo, algum anjo caído dispensou a subespécie de remorsos e culpas. Confiantes na indulgência das urnas e na lentidão da Justiça, os ratos-do-Senado poderão descobrir que, mesmo no faroeste brasileiro, os fora-da-lei que exageram no deboche podem cair do cavalo e acabar na cadeia.
*Augusto Nunes

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