Meu momento Yoani, por Merval Pereira
Na sexta-feira à noite, na inauguração
do museu MAR na Praça Mauá, passei por rápidos instantes a mesma situação que
enfrentou a blogueira Yoani Sanchez quando esteve no país recentemente. Havia
diversas manifestações nos arredores do museu, onde participavam da inauguração
a presidente Dilma Rousseff, o governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo
Paes. O barulho era insuportável dentro do museu, que, com seu lindo teto
ondulado, criou um inesperado efeito acústico dentro do prédio.
Uma era contra o fechamento dos teatros
do Rio depois da tragédia de Santa Maria. Muitos teatros, que funcionavam sem as
medidas de segurança necessárias, continuam fechados e os artistas estavam ali
protestando. Mas protestavam contra o quê? Deveriam mesmo protestar contra o
fato de terem passado todo esse tempo trabalhando e recebendo pessoas em lugares
sem condições de segurança adequadas. Deveriam protestar contra a prefeitura,
mas pelo que ela não fez, e não pelo que está fazendo, embora
tardiamente.
Havia um pequeno grupo reclamando casas
prometidas e não entregues. E um terceiro grupo, mais barulhento e agressivo,
que protestava contra a Medida Provisória dos Portos que, em boa hora, a
presidente Dilma enviou ao Congresso. Aparentemente, não havia no grupo nenhum
estivador ou operário. Eram todos jovens estudantes com máscaras e cartazes que
alertavam: "Gestão mata".
O que esses jovens do PT, do PCdoB, da
Juventude Socialista, do PDT queriam dizer é que a nova legislação sobre os
portos trará prejuízos aos trabalhadores. O que está por trás dos protestos, no
entanto, é uma nada estranhável, embora exótica, aliança entre órgãos sindicais
e empresários que operam os portos sem competição beneficiando-se de uma reserva
de mercado tão ultrapassada quanto prejudicial à economia.
Os jovens radicais estavam ali
protestando contra a possibilidade de os novos administradores de portos
disputarem cargas com os terminais já existentes e contratarem mão de obra pelo
regime da CLT, à qual estão subordinados todos os trabalhadores
brasileiros.
Sindicatos liderados pelo Paulinho da
Força Sindical, deputado federal (PDT), querem impedir a modernização dos
portos, obrigando os novos terminais a contratarem os estivadores pelo Órgão
Gestor de Mão de Obra (Ogmo). E têm o apoio de concessionários dos portos que
querem tudo menos competição para melhorar a produtividade.
No entanto, dar competitividade ao
setor portuário é fundamental para a retomada do crescimento, reduzindo o
chamado custo Brasil. E lá estavam os jovens esquerdistas não apenas
protestando, como seria normal em uma democracia, mas agredindo verbal e quase
fisicamente as pessoas que passavam por uma espécie de corredor polonês que a
polícia deixou que fizessem.
As pessoas que saiam da festa de
inauguração forçosamente tinham que passar pelos manifestantes para pegar seus
carros, e houve momentos em que as agressões verbais chegaram às raias da
agressão física. Uma senhora que ia à nossa frente foi chamada de "fascista"por
um manifestante que gritou tão perto do seu rosto que quase houve contato
físico.
Passei pelo grupo com minha mulher sob
os gritos dos manifestantes, e um deles me reconheceu. Gritou alto: "Aí, Merval
fdp". Foi o que bastou para que outros cercassem o carro em que estávamos,
impedindo que saísse. Chutaram-no, socaram os vidros, puseram-se na frente com
faixas e cartazes impedindo a visão do motorista. Só desistiram da agressão
quando um grupo de PMs chegou para abrir caminho e permitir que o carro
andasse.
Foram instantes de tensão que
permitiram sentir a violência que está no ar nesses dias em que, como previu o
ministro Gilberto Carvalho, "o bicho vai pegar". É claro que o que aconteceu com
a blogueira cubana Yoani Sanchez nem se compara, mas o ocorrido na noite de
sexta-feira mostra bem o clima belicoso que os manifestantes extremistas estão
impondo a seus atos supostamente de protesto.
E é impressionante que jovens ditos
revolucionários se empenhem em defender um sistema arcaico que só interessa às
corporações sindicais que já estão instaladas nos portos e a empresários que se
beneficiam de privilégios que emperram a economia brasileira. A presidente Dilma
está certa ao não aceitar as pressões políticas para mudar a medida provisória
dos portos, essencial para a revitalização da economia.
*Texto: Merval Pereira, em o Globo
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