Os verdadeiros sábios são aqueles que dizem coisas simples, ensinamentos singelos que possam ser entendidos por todas as pessoas e facilitam a vida em sociedade.
Convivi com um destes filósofos populares por muitos anos, o jornalista Frederico Branco, editor de internacional do velho "Estadão". O já veterano Fred costumava dizer aos mais jovens:
"Tem coisa que pode e tem coisa que não pode".
Com todo respeito que tenho pelo ministro José Antonio Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, meu velho amigo e ex-colega de Palácio do Planalto nos dois primeiros anos do governo Lula, este ensinamento se aplica perfeitamente ao seu caso, independentemente do que esteja previsto nas normas e nas regras jurídicas.
Quando aceitou o convite para participar das faustosas comemorações do casamento do advogado criminalista Roberto Podval, na ilha de Capri, no sul da Itália, Toffoli, que é jovem, mas não é mais criança, deveria saber exatamente os riscos que estava correndo.
Como havia mais de 200 testemunhas na celebração, todas hospedadas por conta de Podval no cinco estrelas Capri Palace Hotel, mais dia menos dia esta história se tornaria pública. No mundo globalizado da internet não há mais segredos que durem para sempre nem nada que se possa fazer de errado e imaginar que ninguém vai ficar sabendo.
Ao ver o caso revelado pela "Folha", na semana passada, Toffoli se recusou a falar sobre o assunto e mandou sua assessoria dar a seguinte declaração:
"É importante esclarecer que a viagem do ministro foi de caráter estritamente particular. Diante desse fato, ele se reserva o direito de não fazer qualquer comentário sobre seus compromissos privados".
Aí é que o ministro e sua assessoria se enganam. O casamento pode ter sido um compromisso privado, mas os julgamentos do STF em que o advogado Podval atua e o ministro Toffoli é juiz são de interesse público. Além disso, Toffoli deixou de comparecer a uma sessão do Supremo exatamente porque estava neste casório no exterior.
Não dá para separar a pessoa física do amigo José Antonio Toffoli da pessoa jurídica do ministro José Antonio Toffoli, que é relator de dois processos nos quais o noivo atua como defensor e já atuou em pelo menos outros dois casos de clientes de Podval.
É o tipo da coisa que não pode. De nada adiantou Toffoli se calar e sua assessoria falar em "viagem particular e compromisso privado", pois o próprio noivo veio a público para dizer ao "Estadão", na segunda-feira, que pagou as despesas do ministro em Capri:
"Não paguei apenas para ele, mas para outros 200 amigos que convidei. A única coisa que paguei foi o hotel. Todo mundo, não apenas o ministro, teve direito a dois dias de hotel", esclareceu o nobre advogado.
Teve direito? Ah, bom... Claro que Podval pode fazer com o dinheiro dele o que bem entender, sem dar nenhuma satisfação à torcida, mas Toffoli não tem, não, o direito de aceitar despesas pagas por um advogado que atua nos processos que o ministro julga.
Como diria o comentarista de arbitragem Arnaldo Cesar Coelho, a lei é clara. Segundo o Código de Ética da Magistratura Nacional, criado em 2008, é dever dos juízes recusar o recebimento de qualquer benefício e vantagem que possa comprometer sua independência funcional:
"O exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral".
Se isto vale para um juiz de primeira instância, muito mais vale para um ministro do STF, o cargo máximo da carreira.
Lamento que, por tão pouco (as diárias do hotel variavam entre R$1.400 e R$ 13,3 mil), o amigo tenha colocado em risco seu bom nome e o futuro de uma bela carreira como magistrado, mas como repórter não posso brigar com os fatos e fingir que não vi a notícia no jornal.
Deixo, para finalizar este texto, um outro ensinamento de Frederico Branco, que não emprega termos muito educados para se usar num tribunal, mas encerra uma grande verdade:
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