Primeiras condenações no julgamento do mensalão levam o STF a reafirmar sua independência frente a pressões contraditórias.
Conforme prosseguem as sessões de julgamento do mensalão, que serão retomadas hoje, vai sendo contrariado o prognóstico -frequente em alguns setores- de que seria diminuta a disposição condenatória dos magistrados.
Não se trata apenas do que já se decidiu quanto aos crimes de peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, pelos quais foi condenado o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP).
O ex-presidente da Câmara era, do ponto de vista político, o réu mais importante dos primeiros núcleos do julgamento.
Foi a atitude geral dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), sobretudo ao analisar as provas dos autos, o principal fator a sugerir que não se mostram sorridentes as perspectivas dos advogados de defesa.
Complexo e polêmico, o mensalão põe o STF sob fogo cruzado. À tradicional -e até aqui frustrada- previsão de que a impunidade venceria acrescenta-se a crítica inversa, de que uma predisposição a condenar ditaria os votos dos ministros.
Foi para refutar essa impressão que, no final da última sessão da semana passada, alguns ministros estenderam-se em comentários exteriores à matéria em julgamento.
Não estamos -esta é a essência de seus pronunciamentos- desconsiderando os direitos dos réus, a necessidade de devido processo legal e o princípio da presunção de inocência. Não estamos, sublinharam, desconsiderando a necessidade de provas concretas para condenar os acusados.
"Não nos cabe dar satisfações a ninguém", observou, em nota algo destoante, o relator do processo, Joaquim Barbosa. Mas estavam -e o próprio Barbosa achou importante lembrar que aceitou, ao longo do processo, muitas reivindicações feitas pela defesa.
De um ponto de vista democrático e republicano, na verdade, é bom que estejam. Numa prática adotada por pouquíssimos países, transmite-se ao vivo o julgamento pela TV. Ao público leigo escapa, naturalmente, o histórico doutrinário por trás das decisões em curso.
Insistem os ministros na tese de que provas indiciais, por exemplo, podem ser conclusivas quando a sofisticação do crime -e de seus autores- ultrapassa em muito a rotina do processo penal.
A consideração do "status" dos réus seria fator de corrosão do princípio de que todos são iguais perante a lei? Faz-se justiça levando esse fator em conta ou ignorando-o? As convicções de cada juiz, assim como as de cada cidadão, podem variar conforme o contexto.
Os julgadores também estão sendo julgados pelas suas atitudes. O veredito de uma sociedade democrática jamais será unânime -mas é uma garantia a mais para que o Supremo se fortaleça na independência de suas decisões.
*Editorial da Folha de São Paulo
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