Em janeiro passado, registrei no GLOBO um “negócio estranho” — a compra de 49,9% do Banco Votorantim pelo Banco do Brasil.
Agora, a Caixa Econômica apresenta seu “negócio estranho-2”, série de operações em que o governo Lula aplica o paradoxal modelo petista de ocupação do Estado: grupos privilegiados do setor privado ficam com os lucros e o governo assume os prejuízos.
Se a transação for confirmada, desta vez empregará R$ 750 milhões (que podem chegar a R$ 800 milhões, segundo a agência Reuters) na aquisição de uma parte do Banco Panamericano, instituição financeira que viu seus depósitos a prazo caírem de R$ 2,3 bilhões para R$ 1,5 bilhão — além de já haver cedido à própria Caixa mais de um terço da sua carteira, numa evidente operação de socorro.
Então, de repente, esse mesmo Banco Panamericano passará da condição de instituição debilitada e, portanto, socorrida, a sócio ultravalorizado da Caixa. Sim, porque não haverá uma aquisição de ativos por seu valor de mercado, nem ao menos uma operação de socorro pública e clara, mas um negócio em que o governo, como sempre sem transparência, assume os riscos, e os controladores não apenas preservam seus interesses como ainda se tornam sócios da Caixa Econômica Federal.
É u m a o p e r a ç ã o com grau de subjetividade aceitável na área privada, mas inaceitável na gestão pública: aventuras fazem parte do repertório de riscos e operações atípicas praticadas no mundo empresarial em busca do lucro, mas vedadas pela lei e condenadas moralmente com recursos do governo.
Alguém tem a oferta de melhor negócio privado, hoje, neste país? Torna-se indispensável, portanto, a abertura de um debate no Congresso, uma investigação sobre todas as implicações dessa operação.
S e m d e s p r e z o p e l a análise da moralidade e o p o r t u n i d a d e d a operação, o Congresso deve esclarecer a sociedade sobre se, por exemplo, não está caracterizado desvio de objetivos da Caixa Econômica.
Como o foco da Caixa não é o crédito pessoal, a oposição não pode deixar de avaliar em profundidade essa operação e, até, questioná-la judicialmente. Uma instituição com importantes e decisivas responsabilidades na área do desenvolvimento social (podem-se descartar a prioridade e a ordem de grandeza do financiamento da habitação?) cometeria assim uma temeridade desviando-se de suas atividades fins.
Se o critério for, por exemplo, estatizar o mercado de financiamento de motos — principal área de atuação do Banco Panamericano, assim como o Banco do Brasil entrou no negócio de carros usados ao associar-se minoritariamente ao Banco Votorantim —, vamos ter brevemente um “negócio estranho-3”, depois o 4, o 5 — e assim por diante, e sempre com os recursos públicos assegurando literalmente, como sócio minoritário, os lucros de grupos privados em apuros.
Além do mais, como as ações do Panamericano são negociadas na bolsa, a esta altura, com a divulgação do negócio antes que fosse oficialmente legalizado, não terão faltado espertos para aproveitar a expectativa de uma operação que valorizará bastante esses papéis.
Sem falar da revelação de que a operação envolve um arranjo típico das manobras fraudulentas tão condenadas no mercado acionário: não se formalizaria a aquisição do controle do Banco Panamericano pela Caixa para privilegiar o controlador, em prejuízo dos outros detentores de ações preferenciais, que não receberiam o mesmo valor por seus papéis.
Como todas essas informações são públicas — ou seja, não são boatos nem circulam nos bastidores, já estão na imprensa —, o governo não pode se eximir de explicá-las. Muito menos o Congresso pode se demitir da apuração de tudo. E nem a Justiça de ser acionada
*Texto por RODRIGO MAIA é presidente nacional do Partido Democratas (DEM).
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