quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Lupi: Corrupção sem fim?

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Sindicalista diz que assessores diretos do ministro do Trabalho queriam 60% do imposto sindical para regularizar sua entidade.

Uma acusação pesada bate às portas do gabinete do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Além das denúncias envolvendo o desvio de dinheiro público por meio de ONGs, agora o gabinete do ministro é acusado de extorquir sindicatos para desviar recursos do imposto sindical à central controlada pelo PDT e por assessores de Lupi. Quem faz a denúncia é o presidente do Sindicato de Trabalhadores em Bares e Restaurantes da Baixada Santista, Litoral Sul e Vale do Ribeira (Sindrest), João Carlos Cortez. Na semana passada, ele gravou uma entrevista à ISTOÉ, na qual afirma que existe um esquema de venda de cartas sindicais montado dentro do Ministério do Trabalho. O sindicalista afirma que “tudo é operado por pessoas ligadas diretamente ao ministro”, que falam e agem em nome dele. “Prometeram reativar nosso registro desde que eu repassasse um percentual da arrecadação do sindicato”, afirma Cortez. “Exigiram-me propina numa sala do gabinete onde funciona a Secretaria de Relações do Trabalho”. O caso aconteceu no fim de julho de 2007. Ele conta que procurou Lupi para tentar regularizar o registro de sua entidade. Segundo ele, foi marcada uma reunião pelo deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (PDT-SP). Ela aconteceu no quarto andar do ministério, na sala onde despachava o então secretário de Relações do Trabalho, Luiz Antônio de Medeiros – homem da total confiança do ministro. No organograma do ministério, a Secretaria de Relações do Trabalho integra o gabinete do ministro Lupi. Eram cerca de 10h30 da manhã. Além de Medeiros e Paulinho, participaram do encontro o assessor especial Eudes Carneiro e Luciano Martins Lourenço, presidente do PDT de Santos e braço direito de ­Paulinho. Eles conversaram sentados em volta de uma mesa de madeira redonda, usada para reuniões. “Esperei uns 15 minutos, eles nos serviram café. Medeiros me cumprimentou e indicou seu assessor, Eudes Carneiro, um homem extremamente gentil, que foi quem conduziu a reunião.
Cortez alega que não tinha ideia de que estava diante de um esquema ilegal de arrecadação. Em seguida, diz ele, na presença de todos, perguntou o que poderia ser feito e mostrou um parecer da AGU favorável à regulamentação do seu sindicato. Carneiro, um ex-policial federal que acompanha Lupi há anos, sorriu e falou para o sindicalista ficar tranquilo. “Vamos resolver o seu problema, me disse.” Em seguida, Lourenço explicou o que precisava ser feito. Em vez de procedimentos burocráticos, o sindicalista recebeu uma orientação pouco republicana. “Me fizeram uma proposta indecente, um pedido de propina ali dentro do ministério”, conta. Coagido, ele aceitou. “Eu não tinha outra saída,” justifica. O pedágio consistia em repassar à conta bancária da Força Sindical (central ligada ao PDT e comandada pela dupla Paulinho-Medeiros) um total de 60% de toda a arrecadação sindical que seria obtida pelo Sindrest nos três anos seguintes. Um valor superior a R$ 12 milhões, segundo cálculos do próprio Cortez, com base nos 100 mil trabalhadores que compõem a categoria na região de atuação do sindicato e que têm descontados seus contracheques anualmente em cerca de R$ 205.
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A reunião durou aproximadamente 20 minutos. Lourenço avisou Cortez que esperasse um novo contato dentro de poucos dias. “Saí de lá confiante de que estava resolvido”, afirma. Coube ao dirigente do PDT tocar o negócio. Lourenço explicou a João Carlos Cortez que o valor da propina poderia ser parcelado em três vezes, em percentuais decrescentes. No primeiro ano, seriam repassados 30% da contribuição sindical; no segundo ano, 20%; e no terceiro ano, 10%. Para escapar à fiscalização das autoridades, as transferências deveriam ser feitas diretamente para a conta bancária da Força. Embora recebam dinheiro do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), as centrais sindicais não estão sujeitas à análise do TCU, da CGU e outros órgãos de controle externos, o que dificulta o rastreamento de golpes como os denunciados por Cortezeunião”, lembra. Quem mais falou durante o encontro foi Lourenço.
Hoje quem representa os trabalhadores de hotéis, bares, restaurantes e similares naquela região é o Sinthoresp, mas nem sempre foi assim. O Sindrest conseguiu em 1994 fracionar a base sindical a fim de representar apenas funcionários de restaurantes, bares e similares. Recebeu seu registro e até o código sindical, que dá acesso à conta na Caixa Econômica em que são depositadas as contribuições sindicais. Em 2003, no entanto, a CUT passou a controlar a Secretaria de Relações do Trabalho e, por pressão do Sinthores, cancelou o registro do Sindrest. Cortez recorreu e conseguiu obter da AGU um parecer que considerou ilegal o ato do Ministério. “Não cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego interferir na conveniência e oportunidade de determinada categoria para fundar ou extinguir sindicato”, escreveu a advogada da União Carmen Tomasi de Abreu.
Questões sindicais à parte, a denúncia de Cortez reforça a suspeita de que o Ministério do Trabalho virou um grande balcão de negócios para abastecer os cofres da Força Sindical e de dirigentes do PDT. Na edição de 5 de agosto de ISTOÉ, a presidente da Federação Nacional dos Terapeutas (Fenate), Adeilde Marques, revelou que foi forçada a pagar pedágio para conseguir a liberação das cartas sindicais dos sindicatos filiados. Ela apontou o presidente da Força Sindical em Sergipe, Willian Roberto Arditti, como chefe do esquema no Estado. Segundo Adeilde, o registro custaria até R$ 40 mil. ISTOÉ mostrou ainda como Lupi e Paulinho da Força têm fabricado entidades sindicais para atender a interesses políticos e partidários. Em apenas três anos e meio, foram concedidos mais de 1,6 mil registros sindicais e outros 2,4 mil estão na fila de espera. Em média, surge um novo sindicato por dia no Brasil. O esquema está na mira do Ministério Público do Trabalho, que criou uma comissão especial de 16 procuradores para investigar as denúncias de ISTOÉ. O subprocurador geral do Trabalho, Ricardo Macedo, diz que a decisão foi tomada no fim de agosto, durante reunião nacional dos procuradores. “São denúncias graves que atentam contra a liberdade sindical”, afirma. Também devem integrar as investigações o MPF e a Polícia Federal. “É um caso que envolve não só o aspecto trabalhista, mas o criminal também.”
As suspeitas envolvendo a concessão de cartas sindicais fragilizam ainda mais a posição de Lupi, que perdeu apoio dentro do PDT e do Palácio do Planalto. Na semana passada, ele teve de se defender de novas acusações de desvio de recursos em convênios com ONGs para capacitação técnica. Dois assessores tiveram seus nomes associados ao escândalo e já foram exonerados. Os deputados pedetistas Miro Teixeira (RJ), José Antônio Reguffe (DF) e o senador Pedro Taques (MT) pediram à PGR abertura de investigação. Lupi, confiante na relação de amizade com a presidente Dilma Rousseff, disse que não seria abatido facilmente e só deixaria o Ministério “à bala”. Dilma não gostou e mandou o ministro se retratar. Foi o que ele fez em depoimento na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara, na quinta-feira 10. “Presidente, peço desculpas. Eu te amo!”, disse Lupi. Declarações de amor, contudo, não explicam as denúncias que pesam sobre o ministro e seus auxiliares.
*Claudio Dantas Sequeira, ISTOÉ Online

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